O vereador natalense Daniel Valença (PT) abriu um canal nas suas redes sociais para receber denúncias de potenciais crimes eleitorais. A iniciativa partiu depois que o Ministério Público do Rio Grande do Norte (MPRN) ajuizou uma ação de investigação judicial eleitoral (AIJE) contra o ex-prefeito de Natal Álvaro Dias (Republicanos), o atual prefeito da capital, Paulinho Freire (União), e outros envolvidos por abuso de poder político e econômico nas eleições municipais de 2024.
“Nós divulgamos em nossas redes a notícia de que o Ministério Público Eleitoral ingressou com ação para a cassação da chapa Paulinho Freire e Joanna Guerra, bem como de vereadores aliados, em virtude do crime eleitoral, em virtude do abuso de poder econômico cometido na gestão Álvaro Dias nessas eleições de 2024”, disse Daniel.
“E aí a gente tem recebido uma série de comentários, vários deles anônimos, outros que as pessoas literalmente se expõem”, disse o parlamentar.
Ele utilizou o exemplo da mensagem encaminhada por Jacira Soares, servidora do Estado que ficou cedida por 17 anos ao município, vários deles atuando na área de saúde mental por mais de 10 anos coordenando o CAPS I.
Na mensagem, Jacira diz que após o resultado do segundo turno das eleições, foi comunicada de que não estava mais na direção do serviço, nem poderia mais continuar trabalhando na Secretaria Municipal de Saúde (SMS), tendo sido devolvida à revelia ao Estado, sem motivo ou justificativa.
“É evidente que o motivo da minha retirada do CAPS e devolução ao Estado foi por não ter participado da campanha política do candidato do prefeito”, disse a servidora.
“Então a gente vai abrir chamada, caixinha, vamos abrir nossas redes para recebermos mais denúncias e assim trazer mais elementos, notificar, representar o Ministério Público com esses dados, com essas informações para que a denúncia tenha uma maior substância ainda”, avisou Daniel Valença.
O que diz a denúncia do MP
A ação pede a cassação dos diplomas do atual prefeito, da vice-prefeita eleita, Joanna Guerra, e dos vereadores eleitos, Daniell Rendall e Irapoã Nóbrega, além de inelegibilidade de todos pelo período de oito anos.
O diretor técnico da Agência Reguladora de Serviços de Saneamento Básico do Município do Natal (ARSBAN), Victor Matheus Diógenes Ramos de Oliveira Freitas, também é alvo da AIJE.
Na AIJE, o MPRN apresenta indícios de que servidores comissionados e terceirizados foram cooptados para apoiar os candidatos a vereador, Daniell Rendall e Irapoã Nóbrega, além do candidato a prefeito, Paulinho Freire, e da candidata a vice-prefeita, Joanna de Oliveira Guerra. Esse apoio teria sido obtido por meio de influência/coação, como ameaças de demissão e exoneração, e através de postagens em redes sociais e eventos públicos.
Os elementos denotam que Álvaro Dias, à época prefeito, organizou essa prática através do loteamento das secretarias e dos órgãos municipais para garantir apoio político, utilizando a máquina pública para beneficiar as campanhas dos candidatos aliados.
Existem ainda evidências de que a gestão municipal ofereceu serviços públicos em troca de apoio eleitoral, explorando lideranças locais para cooptar eleitores.
Além da cassação de mandatos e da inelegibilidade, o MPRN pediu a aplicação de multa aos envolvidos bem como informações ao Tribunal de Contas do Estado (TCE) e à Controladoria Geral do Município de Natal.
Matéria da SAIBA MAIS é utilizada pelo MP para embasar denúncia
Uma reportagem da Agência SAIBA MAIS foi utilizada pelo Ministério Público para embasar a denúncia contra o diretor técnico da Agência Reguladora de Serviços de Saneamento Básico do Município de Natal (Arsban), Victor Diógenes.
Cunhado de Álvaro Dias, ele havia sido exonerado do cargo por assédio eleitoral em 15 de outubro, depois que um áudio no qual ele aparece cobrando votos de funcionários terceirizados e comissionados para Paulinho Freire (União) foi entregue ao Ministério Público do Trabalho do Rio Grande do Norte (MPT-RN). Posteriormente, em 1º de novembro, passadas as eleições, Diógenes foi renomeado para o cargo.
No áudio que motivou a exoneração em outubro, durante o segundo turno da disputa pela Prefeitura, o diretor da Arsban cobrava votos para Paulinho Freire, mas negava que a prática fosse assédio eleitoral:
“O período eleitoral começou, todos vocês são competentes para estar onde está. Eu sei que aqui tem pessoas que foram nomeadas e estão aqui desde o tempo de Carlos Eduardo, isso para mim não é um problema, é do tempo de outros diretores, mas o fato é que a minha permanência, a de vocês e de todos aqueles que são terceirizados e comissionados da Prefeitura vai depender da gestão, desse pedaço que tem, que esse gestor está, e quem ele vai apoiar, certo? Isso daqui não é assédio moral, não é assédio político. A gente tem que ter ciência do que está fazendo porque se alguém tiver posicionamento diferente, me avise. Vai ter que colocar o cargo à disposição porque senão vai sobrar pra mim. Se eu não consigo liderar, se eu não consigo coordenar quem trabalha comigo, então eu não tô lá para desempenhar essa função, tá certo?“, discursava Victor Diógenes.
O áudio foi registrado durante uma reunião dentro da Arsban, durante o horário de expediente, no dia 9 de agosto. Na denúncia, o MP aponta que o então diretor da ARSBAN valeu-se da sede da entidade para fins de realizar reuniões com os empregados terceirizados e os servidores comissionados, ameaçando o emprego desses, caso não favorecessem politicamente o candidato Paulinho Freire.
“Reiteradamente, o Sr. Victor Diógenes repete que se esses servidores/terceirizados quisessem apoiar outros candidatos que então entregassem os cargos. Nos termos das provas colhidas, para tais reuniões só eram chamados os cargos em comissão e os empregados terceirizados, pessoas com vínculo jurídico precário, passíveis, pois, de serem coagidas ante a ameaça de possível perda do sustento. Surge, com essas atitudes, o abuso do poder político o qual ocorre nas situações em que o detentor do poder se vale de sua posição para agir de modo a influenciar o eleitor, sendo um ato de autoridade exercido em detrimento do voto, com cerceamento dos direitos dos eleitores (servidores/ terceirizados) em sua fundamental liberdade política”, aponta trecho da denúncia.