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Produtores de cinema denunciam uso do nome do RN em filme que venceu Gramado

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“Lendo o Mundo” levou o Kikito de melhor longa documental da edição 2025 do Festival de Gramado, realizado entre os dias 13 e 23 de agosto. Assinado pela norte-americana Catherine Murphy e pela brasileira Iris de Oliveira, o filme retrata a vida de Paulo Freire e sua importância para a Educação e Democracia no Brasil e no mundo.

Mas, além do tema, uma outra coisa que chamou a atenção para o premiado documentário foi o fato dele estar inscrito como se tivesse sido produzido no Rio Grande do Norte. O longa documental até teve algumas imagens captadas em terras potiguares, mais especificamente nas cidades de Angicos e Natal. Porém, isso não é suficiente para caracterizar uma produção como pertencente a um território.

““É como Emilia Pérez, um filme francês, apesar de ter se passado no México. Você filmar em um lugar não faz do filme uma produção daquele local. É preciso ter um agente econômico, que pague impostos no estado e é assim que a Ancine (Agência Nacional de Cinema) reconhece uma empresa brasileira produtora independente como de determinado local. O filme poderia acontecer como produção de São Paulo (uma das empresas responsáveis pelo filme é paulista)mas informaram que é daqui, sendo que não trouxe nada para cá. É uma conquista simbólica que não se reverte para o estado”, lamenta o diretor de cinema Pedro Fiúza.

Produtores e cineastas potiguares elaboraram uma carta e informaram ao Festival de Gramado o uso “equivocado” do nome do Rio Grande do Norte como de autoria do filme. O documento traz a assinatura de realizadores audiovisuais e de duas entidades de classe, a Associação das Produtoras Independentes do Audiovisual Brasileiro (API) e a Conexão Audiovisual Centro-Oeste, Norte, Nordeste (CONNE).

““Como colocamos na carta, não temos nada contra a obra, as diretoras, mas dizer que o filme é do RN, sem ser, causa constrangimento. Para ser classificado assim há regras sobre a tipologia… o que é que pode ser chamado de obra brasileira? O que é que pode ser chamado de obra brasileira independente? O regramento diz que é para filmes brasileiros independentes. A comprovação geralmente é feita utilizando a origem da empresa que produziu o filme e como a empresa divulgada não comprova que é do RN, os realizadores não reconhecem e causa dificuldade porque o Festival colocou uma regra que teoricamente não cumpriu. Foi feita uma pesquisa e observado que a produtora de origem não tem CPB (Certificado de Produto Brasileiro), para tirar é preciso mandar documentações para a Ancine (Agência Nacional de Cinema) e uma das regras é que os autores cedam seus direitos autoriais para a produtora brasileira independente, que para ser classificada dessa forma também precisa cumprir outros regramentos. Não há um vínculo entre a produtora e o Rio Grande do Norte”, atesta Gabriel Pires, membro da diretoria da CONNE.

Na carta, enviada em 26 de agosto, os realizadores de cinema potiguar ressaltam as qualidades do filme e da equipe envolvida, mas questiona a inscrição do documentário em nome do Rio Grande do Norte.

““A resposta deixa claro que o filme não é do Rio Grande do Norte. O Festival não é responsável pelo fornecimento das informações. Respeitamos o filme, a produção, o currículo das diretoras, são pessoas com um trabalho sério. Só queríamos saber qual empresa potiguar foi responsável ou coproduziu o filme”, reforça Fiúza.

Realizadores potiguares argumentam que, ao dizer que a produção é do Rio Grande do Norte, a equipe do filme pode ter tido vantagens ao concorrer a editais de financiamento e até mesmo em festivais, como o de Gramado, que valorizam a diversidade.

““Foram duas empresas informadas como responsáveis, a Maestra Production, que nos parece nem ser brasileira, mas norte-americana, e o Instituto Paulo Freire, responsável pela inscrição, sediada em São Paulo. Não tem ninguém na equipe do Rio Grande do Norte ou que atue no RN. Há uso simbólico de má fé ou equivocado do nome do estado. Até na resposta do Festival, que preza por diversidade territorial, que venha de diferentes estados, obviamente isso parece ter contado para o filme ter conquistado esse espaço”, destaca Fiúza.

Segundo o diretor potiguar, as equipes costumam valorizar as bandeiras dos estados de produção até mesmo na entrada do tapete vermelho. Os nomes dos estados também costumam ser citados nas entrevistas e nada disso aconteceu no caso de “Lendo o Mundo” com o Rio Grande do Norte.

Equipes levam bandeiras dos estados para o tapete vermelho I Imagem: reprodução redes sociais

““As equipes dos filmes entram com bandeiras dos estados, citam o estado nas entrevistas, na apresentação do filme e quando são premiados. Mas, nesse caso, o nome do estado não é mencionado pela produção. Queremos combater a espoliação que tem ocorrido no estado a partir de filmes que se utilizam do estado simbolicamente ou até oficialmente para serem selecionados em festivais e conseguir financiamento sem trazer nenhum retorno para o estado! Não há uma real conexão. É triste porque o tema é urgente e importante, são duas diretoras mulheres, uma americana e outra baiana, que têm um trabalho sério. Ninguém da equipe pensou em fazer uma correção? Por isso entendemos como ato de má fé, continuaremos a ser espoliados?”, questiona Fiúza.

Atualmente, há nove filmes de longa metragem sendo rodados no estado.

““O Rio Grande do Norte não tem economia para produzir longa a todo momento. Há, atualmente, nove filmes sendo rodados provenientes da Lei Paulo Gustavo. Eles são tão raros que a gente sabe quando tem alguém fazendo um filme. Os curtas acontecem mais facilmente, mesmo assim, ficamos sabendo, sempre tem algum colega que trabalha em uma das produções”, contextualiza o diretor potiguar.

A AGÊNCIA SAIBA MAIS entrou em contato com a diretora norte-americana Catherine Murphy. Por telefone, ela explicou que não entendia da burocracia brasileira e que só colocou que as cenas haviam sido filmadas no Rio Grande do Norte. Para dar respostas mais assertivas, ela passou nosso contato para uma produtora brasileira e afirmou que ela entraria em contato conosco, mas, até a publicação deste matéria, nós não fomos contactados. O espaço segue aberto.

Folder de apresentação do filme no Festival de Gramado

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