Mariana Eloyse, 32, começou a vender doces que fazia por passatempoem 2017, e se profissionalizou na comercialização desses itens durante a pandemia de coronavírus. Hoje, ela é dona da Chei de Doce, e uma das milhares de empreendedoras potiguares que lideram pequenos negócios. Nesse sentido, a participação de mulheres donas de negócios é crescente, aponta o levantamento “Empreendedorismo Feminino no Rio Grande do Norte: Especial 08 de março”, realizado pelo Sebrae/RN.
O estudo registrou, em 2021, 10.298 novos pequenos negócios comandados por mulheres no RN. Em 2024, esse número foi de 15.793, um crescimento de 53,35% em quatro anos. Já em janeiro de 2025, as potiguares abriram 4.061 novos pequenos negócios. Contudo, outros indicadores expõem os desafios que as empreendedoras enfrentam, como desigualdades de renda.
Na avaliação de Mona Paula, gerente de negócios de impacto do Sebrae/RN, o estado tem um empreendedorismo feminino atuante.
“A busca pelo empreendedorismo é a oportunidade para independência financeira e autonomia das mulheres. Quando olhamos os dados, também vemos o fortalecimento do número de mulheres empresárias: 42% considerando todos os portes de negócios formais, e 31% entre formais e informais nas micro e pequenas empresas”, afirma.
Para Mariana Eloyse, empreender foi algo que surgiu aos poucos. Ela conta que sempre gostou de doces e começou a fazer brigadeiros, que distribuía no Departamento Estadual de Trânsito (Detran), onde trabalha de forma paralela à microempresa.
Os colegas a incentivaram a comercializar seus produtos, algo que ela faz até hoje. A potiguar compartilha que planeja expandir a própria microempresa individual (MEI) nos próximos anos e depender exclusivamente dessa renda.
Uma doce história de empreendedorismo
Com a pandemia, Mariana Eloyse passou a fazer bolos caseiros, além dos brigadeiros, e agora sua loja faz encomendas de uma maior diversidade de bolos, inclusive produtos sem açúcar e sem lactose. Mariana tem uma ajudante e trabalha em Natal e região metropolitana, realizando entregas. Ela conta que buscou capacitação profissional para ampliar os serviços prestados na pequena empresa.
““Me percebi empreendedora quando vi que as coisas estavam dando certo. Foi quando eu abri meu MEI e comecei a ser reconhecida no mercado”diz.
Para a potiguar, empreender possibilita que ela trabalhe com algo que ama. O caminho não foi fácil para a empreendedora, que enfrentou resistências no começo da profissão. Além disso, ela diz que os pequenos negócios costumam ser desvalorizados frente às grandes empresas – no caso dela, buffets com vários empregados, por exemplo.
“Enfrentei muita resistência. Não só por ser mulher, mas por ser iniciante nesse ramo de confeitaria também. A resistência, como mulher, não é nem tanta resistência, mas infelizmente há muita rivalidade”. Ela opina que nenhum mercado é só de homens ou de mulheres.
Segundo Mariana, a proposta da Chei de Doce é ter produtos acessíveis, mas de qualidade. Contudo, a alta nas matérias-primas pede que ela atualize os preços, o que nem sempre seus clientes entendem.
Em relação à desigualdade de renda no setor em que trabalha, ela diz que não observa esse problema, até porque os confeiteiros elaboram os próprios preços. Mas, no outro posto de trabalho que ocupa, ela percebe algumas diferenças.
Cenário apresenta desafios
Os setores de serviços (44%) e comércio (45%) são os que mais concentram mulheres empreendedoras, ante uma baixa representatividade nos setores de construção civil (17%) e no agronegócio (31%), que são tradicionalmente dominados por homens. “É importante fortalecer a maturidade dos negócios, ampliar o número de empregadoras e fortalecer ações como acesso a crédito, programas e mercado (para mulheres)”, observa Mona Paula.
“A presença de mais mulheres à frente de negócios é fundamental para economia, sociedade e organizações, principalmente à frente de cargos de liderança e com poder de tomada de decisão. Elas contribuem diretamente na inclusão de mais mulheres no ecossistema empreendedor, tornam o ambiente mais colaborativo e mais inovador, pois trazem diversidade”diz a especialista.
As potiguares empreendedoras recebem proporcionalmente menos do que os homens, de acordo com o levantamento. Mulheres negras donas de negócios, por exemplo, possuem uma renda 28% menor que a dos homens negros, 49% inferior à das mulheres brancas e 61% menor que a dos homens brancos.
A nível nacional, mesmo tendo maior escolaridade, as mulheres ainda são menos remuneradas nos pequenos negócios.
Segundo outra pesquisa do Sebrae, 72,4% das donas de negócios no Brasil têm ensino médio completo ou mais; e quase 29% dessas mulheres têm superior completo – índice 13 pontos percentuais maior do que o público masculino com ensino superior ou mais. Apesar disso, o rendimento médio real das mulheres donas de negócios no quarto trimestre de 2024 foi de R$ 2.867, o que é 24,4% menos do que os homens que empreendem.
“A questão das diferenças de ganhos entre homens e mulheres não é uma novidade e ela vem se reduzindo, como mostra a pesquisa. Entretanto, (isso ocorre) num ritmo lento e precisa ser acelerado por políticas de equidade e programas de incentivo e fomento ao empreendedorismo feminino, seja investindo em fundos de investimento para mulheres, taxas diferentes de juros, fontes alternativas de captação, incubadoras femininas etc”avalia Mona Paula.
Chefes de família
Além de se desdobrar para lidar com a rotina de uma pequena empresa, muitas vezes as mulheres são chefes de família e lidam com a rotina de casa. É o caso de Mariana Eloyse, que tem dois filhos, cuida da mãe, é empregada do Detran e tem a loja de doces.
“É um desafio insano. Eu até faço acompanhamento psicológico por conta disso, que às vezes eu não consigo segurar. Minhas produções, meu trabalho, tenho dois filhos, ainda cuido da minha mãe. E eu não paro nenhum segundo”.
“E eu fico orgulhosa. Primeiro, é cansativo, é. Mas, quando chega no final do dia, e eu consigo listar tudo o que eu consegui sozinha, é recompensador”reflete.
Outra mulher ajuda na confecção dos bolos e doces, dando suporte. Para Mariana, é importante nunca se deixar abater pelas dificuldades e “nunca baixar a cabeça” nem desistir dos projetos.
Mona Paula argumenta que é preciso políticas também pensadas em mães. “Essas ações contribuem para elevar a maturidade dos negócios e sua participação no mercado. Além disso, são necessárias políticas mais abrangentes, como escolas e creches de qualidade, contraturnos e tempo integral para os filhos de mulheres chefes de família e mães solos”.
Perfil da empreendedora no RN
Quanto ao perfil da mulher empreendedora potiguar, a pesquisa do Sebrae/RN aponta que 42% das empresas no estado têm mulheres como principais sócias, num total de 118.593 negócios ativos. São eles: MEIs (61.462), microempresas (43.436), empresas de pequeno porte (7.077) e empresas de médio e grande porte (3.915).
Já os segmentos com maior concentração de mulheres à frente de negócios são saúde e bem-estar (20,8%), moda e confecção (15,4%) e serviços de alimentação (8,9%), áreas conhecidas por oferecerem mais oportunidades para a força de trabalho feminina.
Além disso, a pesquisa indica que a região metropolitana de Natal concentra o maior número de pequenas empresas lideradas por mulheres (66.156), seguida pelo Alto Oeste (14.665) e Vale do Açu (7.332), com uma participação feminina equilibrada nas diversas regiões do estado, variando entre 40% e 43,7%.
Apoio para mulheres empreendedoras
Mona Paula explica que o Sebrae/RN tem o programa Sebrae Plural para atender a grupos sub-representados no empreendedorismo, como mulheres, quilombolas, pessoas negras, pessoas com deficiência e indígenas.
O Sebrae Delas, por exemplo, foca em mulheres e oferta uma série de eventos, feiras, capacitações e programas exclusivos para público feminino, além dos projetos Mulheres Arretadas, Lidere Delas, prêmio Sebrae Mulher de Negócios, mulheres do agro, jornada online de empreendedorismo feminino e mulheres em foco.
No Mês Internacional da Mulher, o Sistema Sebrae está oferecendo 11 mil vagas para treinamentos exclusivos voltados para mulheres empreendedoras em todo o Brasil. Os cursos gratuitos abrangem áreas como alimentos e bebidas, beleza, moda e marketing, com o objetivo de incentivar e acelerar o empreendedorismo feminino. As inscrições podem ser feitas pelo link: Empreendedorismo Feminino.