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Extrema-direita impõe agenda reacionária e mira opositores na Câmara de Natal

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A Câmara Municipal de Natal (CMN) que emergiu das urnas em 2024 assumiu um perfil de viés conservador que mudou significativamente o equilíbrio político na capital potiguar. Dos 29 vereadores empossados ​​em 2025, apenas quatro são de esquerda. A ampla maioria, embora com diferentes nuances, se posiciona à direita do especto ideológico – os mais radicais, no entanto, são assumidamente ligados à extrema-direita. O que os une é o fato de integrarem a base de apoio do prefeito Paulinho Freire (União), o que dá ao chefe do Executivo o poder de impor sua vontade sobre o Legislativo.

Esse viés conservador tem se refletido na agenda que vem pautando as discussões na CMN. Em maio, os vereadores aprovaram o título de “Cidadão Natalense” ao ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), apesar das críticas e dos votos contrários da bancada de esquerda.

Em março, foi criada a “CEI das Invasões”, proposta pelo vereador bolsonarista Matheus Faustino (União), um dos integrantes mais radicais da ala da extrema-direita na CMN, com o objetivo de criminalizar o Movimento de Luta nos Bairros, Vilas e Favelas (MLB). O relatório final foi aprovado na última quarta-feira (20) com 17 votos favoráveis, 4 contrários e 1 abstenção.

Projetos com foco na chamada “agenda de costumes” também ganharam espaço. A Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), por exemplo, rejeitou uma proposta da vereadora Thabatta Pimenta (PSOL) para combater o racismo religioso, especialmente contra religiões de matriz africana.

Na última semana, foi aprovado em primeira discussão um projeto da vereadora Camila Araújo (União) que proíbe a presença de crianças em paradas LGBTQIAPN+.

A iniciativa foi criticada por especialistas, como o psicólogo Gilliard Laurentino, que considerou a proposta “extremamente preconceituosa” e afirmou que eventos do tipo “trazem reflexão para a sociedade, não erotização infantil”.

Perseguição a opositores

A ofensiva também alcançou o campo político. A vereadora Brisa Bracchi (PT), líder da oposição, enfrenta um processo de cassação, apresentado pelo vereador Matheus Faustino, que a acusa de usar dinheiro de uma emenda parlamentar para bancar um evento em comemoração à prisão domiciliar do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL).

Brisa se defende afirmando ser vítima de “perseguição política”:

“Querem silenciar meu mandato porque faço oposição firme ao prefeito. É uma tentativa de intimidação”esses.

Na última sexta-feira (22), dia em que a vereadora foi notificada da abertura do processo de cassação, movimentos sociais, coletivos de esquerda e parlamentares petistas organizaram um ato em defesa do seu mandato, denunciando a ofensiva conservadora.

Após a manifestação, Matheus Faustino e a vereadora Anne Lagartixa (Solidariedade) acusaram Brisa de “quebra de decoro parlamentar”. Eles alegaram que os apoiadores da petista fizeram um “corredor polonês” para “intimidar” o chefe da Procuradoria Legislativa da CMN.

““Há uma hegemonia evidente da extrema-direita”, destaca professor da UFRN

Para o professor do Departamento de Ciências Sociais da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN), Willington Germano, há uma evidente hegemonia da extrema-direita na Câmara Municipal de Natal.

“Não é apenas conservadorismo. É uma Câmara Municipal dominada por projetos reacionários, homenagens a figuras da extrema-direita e perseguição aos poucos opositores. A recente perseguição à vereadora Brisa Bracchi é resultante dessa correlação de forças no legislativo municipal com a hegemonia da extrema-direita”, refletiu, antes de completar:

“A bancada progressista é amplamente minoritária. A Câmara Municipal, com essa configuração, segue aprovando ataques aos direitos humanos e sociais, ataques aos movimentos sociais e às demandas identitárias, além de fazer elevadas homenagens a nomes da extrema-direita do país, como foi o caso da concessão do título de ‘Cidadão Natalense’ ao ex-presidente Jair Bolsonaro”, citou.

Citando a obra do filósofo italiano Umberto Eco (1932-2016), “Fascismo Eterno”, o professor destacou a importância da “resistência e a brava atuação da bancada progressista, oposicionista da atual gestão municipal, que detém ampla maioria na Câmara Municipal”.

Uso da máquina pública e “política disruptiva”

O doutorando em Ciência Sociais pela UFRN, Germano Neto, reforça a análise do professor Willington, apontando duas razões estruturais para essa composição hegemonicamente conservadora na Câmara Municipal de Natal.

“Há dois eixos. O primeiro é o conservadorismo tradicional, sustentado pelo uso de emendas e da máquina pública, que favorece aqueles que têm uma tradição política mais antiga a se perpetuarem no poder. O segundo é uma política mais disruptiva, fortalecida pelas redes sociais e por narrativas ideológicas de extrema-direita“, Esses.

Para ele, esse segundo movimento é impulsionado por discursos morais e pelo uso intenso de plataformas digitais para criar pautas de valores e costumes, distanciando-se da política tradicional.

Germano Neto acrescenta um olhar mais amplo para o fenômeno.

“O avanço do conservadorismo não é exclusivo de Natal. Em parte, se explica pela crise econômica, que fragiliza o papel do homem provedor e gera uma reação de retração nos valores familiares e morais. Quando esses papéis tradicionais são questionados pelo avanço das mulheres e das minorias, surgem resistências que se expressam na política, inclusive em câmaras municipais.”

Para fazer frente a esse avanço da extrema-direita, o cientista social aponta que o caminho é “recriar uma noção de solidariedade” capaz de “enxergar o outro, aquele que é diferente de nós, também como similar a nós”.

“É somente dessa maneira que a gente consegue construir uma possibilidade de vivência do comum, criando campanhas de conscientização e mobilizando a sociedade para perceber esse outro como alguém similar a nós, que vivencia as mesmas experiências que nós vivenciamos”pregou.

Essa, na visão dele, é a única maneira de se contrapor aos valores que são propagados pelo capitalismo, que colocam o lucro acima da vida.

“Precisamos inverter essa fórmula e apresentar outro modelo da vida acima do lucro”.

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