A Prefeitura de Natal concluiu a engorda da praia de Ponta Negra no sábado (25) após quatro meses marcados por disputas entre a Prefeitura e órgãos ambientais, além da própria indefinição acerca de quem deveria fazer as fiscalizações: se partiria do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) ou do Instituto de Desenvolvimento e Meio Ambiente (Idema).
A obra iniciou em 20 de setembro, às 23h, quando a draga começou a depositar os primeiros 2 mil metros cúbicos de areia, marcando oficialmente o início da intervenção. No total, 1 milhão de metros cúbicos de areia foram utilizados para recuperar e ampliar a faixa de areia, que resultou na ampliação da faixa de areia ao longo de 4,6 quilômetros da orla, iniciando na Via Costeira até o Morro do Careca. A entrega da obra está prevista para a próxima sexta-feira (31).
Neste período, o Ministério Público Federal (MPF) pediu mais de uma vez ao Instituto de Desenvolvimento Sustentável e Meio Ambiente do Rio Grande do Norte (Idema) para que fossem feitas vistorias no local. A última vez foi em 15 de janeiro, depois de fortes chuvas na capital potiguar que deixaram o local da engorda alagado.
Em um ofício, o MPF estipulou prazo de 10 dias para uma resposta do órgão estadual. O documento destacou que um laudo técnico da Secretaria de Perícia, Pesquisa e Análise (Sppea) do MPF, elaborado em outubro de 2024, já apontava a necessidade de esclarecimentos sobre a obra de drenagem de águas pluviais, essencial para o aterramento hidráulico. O projeto não previu adequações da drenagem no trecho entre o Morro do Careca e o dissipador de energia (caixa de controle de vazão) mais próximo ao morro.
Assim, de acordo com o laudo, mesmo com a previsão de revitalização dos 14 dissipadores existentes na área das obras, o trecho mais próximo ao Morro do Careca não foi considerado, “embora seja de grande relevância, visto que contém justamente o cartão postal da área e local de notável erosão da praia”. O laudo também indicou que é preciso corrigir divergências entre os detalhes dos dissipadores, que apresentam dimensões diferentes no projeto.
Como o prazo de 10 dias considera só os dias úteis, esse limite ainda não chegou ao fim. O Idema informou à Agência SAIBA MAIS que, por isso, não se posicionaria. A assessoria disse ainda que a equipe técnica está avaliando o pedido junto ao corpo jurídico.
Falta de fiscalização
A engorda viveu, nestes quatro meses, uma espécie de disputa para saber de quem é a responsabilidade de fiscalização da obra, se seria do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) ou do Instituto de Desenvolvimento e Meio Ambiente (Idema), que é um órgão estadual
Já no ano passado, em ação civil pública apresentada à Justiça Federal em outubro com pedido de urgência, o MPF sustentou que a fiscalização da obra na praia deveria ser feita pelo Ibama. Enquanto o pedido não é analisado, o MPF entende que o Idema deve fazer a vistoria, para que haja um efetivo acompanhamento por órgão ambiental de eventuais intercorrências da obra.
Em dezembro, o órgão cobrou a Justiça e reclamou da falta de fiscalização. À época, segundo o MPF, a obra já teria atingido 70% de sua totalidade, sem que nenhum órgão ambiental tivesse feito a devida fiscalização da retirada dos sedimentos do fundo do mar — utilizados para ampliar a faixa de areia da praia —, apesar de todos os riscos ambientais envolvidos. Hoje, a obra já passou dos 90% de conclusão.
O MPF defendeu que Ibama é o responsável pela fiscalização da obra de engorda. Mesmo se tratando de área da União, o Ibama repassou ao órgão estadual, o Idema, a competência para fiscalizar e licenciar a dragagem, a partir de um acordo de cooperação técnica assinado em 2023.
“No entanto, pressões políticas, decisões judiciais de órgãos não competentes e a insuficiência do corpo técnico do Idema para tratar do caso resultaram no comprometimento do trabalho do instituto e a engorda vem ocorrendo, atualmente, com a utilização de areia de uma jazida que não passou pelo licenciamento dos órgãos ambientais”, alertou o Ministério Público Federal.
“Enquanto o Ibama não assume seu dever e o Idema não se responsabiliza mais pela fiscalização – tendo alegado inclusive que o novo trecho de retirada de sedimentos não faz parte da área prevista no acordo de cooperação –, os trabalhos seguem, ampliando os possíveis danos à fauna e à flora marinha”, disse também o MPF.
O futuro de Ponta Negra
Segundo o secretário de Meio Ambiente e Urbanismo (Semurb), Thiago Mesquita, no momento está sendo realizada a parte final de consolidação com maquinários, principalmente na área do Morro do Careca.
De acordo com Mesquita, o objetivo da Prefeitura de agora em diante é dar prioridade ao processo de ordenamento da praia, focando na finalização do cadastramento dos ambulantes e quiosqueiros e na demarcação da área reservada para os informais em toda a extremidade do calçadão. E, no futuro, pelos próximos dois anos, ainda está previsto o início do projeto de reurbanização do calçadão com parcerias público-privadas para mais investimentos na orla.
Ainda de acordo com Mesquita, foi colocado um talude no aterro hidráulico próximo à água que tem cerca de 3,5 m de altura.
“Com ele, a entrada e saída do mar requerem um pouco mais de atenção, mais do que já se tinha anteriormente, haja vista que a praia de Ponta Negra tinha uma grande quebra de onda ali no início da areia. Porém, isso já será suavizado nos próximos três a quatro meses, após a obra”, acrescenta.
Ele também falou sobre o surgimento de rodolitos na areia e a formação de poças de água da chuva em virtude da obra no sistema de drenagem da praia, que ainda está sendo realizada e segue na parte final pela Secretaria Municipal de Obras e Infraestrutura (Seinfra). Mesquita explica que as pedrinhas na areia chamadas de rodolitos são um material natural e comum no fundo de todos os oceanos, trazido junto com a retirada da jazida.
“É impossível, durante o processo de explotação da areia, que esse material calcário não venha junto. Ele é inerte e está depositado no fundo do mar. Mas, a partir de fevereiro, serão colocados equipamentos para fazer toda a filtragem e retirar esse material concentrado, principalmente na área central da praia”, revela.
Já em relação à formação de poças na areia e à drenagem da praia, o titular da Semurb esclarece que os alagamentos que ocorrem na praia após fortes chuvas são uma solução temporária adotada durante a troca de drenagem, pois o equipamento anterior tinha 30 anos e já não suportava as chuvas.
“Desse modo, a drenagem nova e mais moderna evita as chamadas voçorocas, que formavam sulcos na areia e arrastavam o material. Com essa nova drenagem, isso não ocorre mais. Pode vir a acontecer, eventualmente, pequenos lagos, principalmente na fase de finalização do sistema de drenagem. Quando a drenagem for 100% finalizada, episódios como esses não ocorrerão mais”, aponta.
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