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Monstros são seres estranhos que vivem em habitats ermos, escondidos e que aparecem na calada da noite para aterrorizar e até matar suas vítimas.
Monstros moram em pântanos, cavernas, florestas, em lagoas, nos mares. Monstros não falam. Monstros urram um som de terror.
Os monstros estão no imaginário e há várias décadas (ou séculos) são representados no cinema, na literatura, na pintura e em outras artes.
O sujeito que quase matou uma mulher, em Natal, sábado passado, não é um monstro. Igor Cabral é o nome dele. Tem CPF, endereço fixo e mantinha uma relação pessoal com a vítima. Aliás, esse é o perfil de mais de 80% dos agressores de mulheres no Brasil.
Igor não era um estranho, não vivia entocado numa caverna ou na floresta, nem apareceu na calada da noite para aterrorizar e matar Juliana.
Os mais de 60 socos que Igor deu na cara da ex-namorada foram à luz do dia, dentro de um elevador com câmeras internas, num condomínio de classe média, num bairro nobre da cidade.
E com um agravante: Igor era reincidente. Ele já tinha agredido a vítima antes. Segundo Juliana, até o dia do crime, Igor só não tinha tentado matá-la. Ainda.
Essa é outra característica importante de crimes do tipo: na maioria dos casos, a vítima já foi violentada outras vezes pelo mesmo agressor.
Sempre que a sociedade, com uma ajuda generosa da imprensa e agora mais ainda de influenciadores digitais, chama de monstro um criminoso, dificulta a percepção de que, na maioria das vezes, agressores como Igor estão dentro de casa, dividindo o mesmo teto e até dormindo na mesma cama da vítima.
Ninguém vive nem dorme com monstros. Até que se prove o contrário, ninguém namora, noiva ou se casa com seres estranhos que vivem escondidos e só aparecem na calada da noite para matar suas companheiras.
Chamar de monstros pessoas comuns que convivem com a nossa família ou pertencem aos nossos grupos sociais talvez seja a forma mais fácil de fechar os olhos para um problema muito mais grave: a violência contra as mulheres é praticada pelos homens que estão ao nosso lado.
São nosso pais, nossos irmãos, nossos tios, nossos colegas de profissão, nossos amigos. Somos nós mesmos.
Monstros vendem jornal e ajudam a ampliar a audiência das nossas contas do Instagram. Mas não resolvem nem ajudam no debate. E muito menos contribuem para enfrentar de fato o problema.
(Tagstotranslate) Blog-Rafael-Duarte
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